terça-feira, maio 31, 2005

Em Maior Liberdade

O que vi de mais interessante no seminário em São Paulo foi a atuação de organizações da sociedade civil na área de direitos humanos, entendendo essa expressão em seu sentido mais amplo e atualizado, que abarca também novos elementos como o “direito ao desenvolvimento”. Há muitas discussões sobre isso no âmbito da ONU, por conta dos debates sobre a reforma da instituição.

Kofi Annan publicou recentemente um relatório, “In Larger Freedom: towards development, security and human rights for all” que servirá de base para a cúpula de chefes de Estado que ocorrerá em setembro, em Nova York. O secretário-geral faz várias sugestões para melhorar o desempenho do sistema ONU no campo dos DHs, as principais são a criação de um Conselho especializado e a realização de uma conferência internacional para regular o combate ao terrorismo.

É uma agenda bem formulada, dentro das limitações do momento político atual. O ponto fraco é que as propostas de Annan são muito ruins no que toca ao aspecto econômico e social dos DHs, indo pouco além de um pedido por mais ajuda humanitária. O arcabouço das instituições do FMI, do Banco Mundial e da OMC não é tocado.

O Brasil tem investido muito na campanha para se tornar membro permanente do Conselho de Segurança. O que poucos sabem é que nossa diplomacia tem adotado posições escabrosas nas votações internacionais sobre DHs, em troca do apoio das grandes potências às ambições brasileiras. Minhas colegas na Conectas Sur fizeram um levantamento das atividades do Itamaraty na Comissão de DHs da ONU. Os diplomatas foram contra as Nações Unidas investigarem violações de DHs sempre que estavam envolvidos EUA, China, Rússia e mesmo a África do Sul.

Como nosso país irá votar no Conselho de Segurança, caso se torne membro permanente? Provavelmente, repetindo esse padrão. Às vezes me pergunto se o Itamaraty realmente tem algum projeto para o CS, ou se tudo não passa do deslumbramento da nossa elite diplomática pelo jogo de prestígio das Nações Unidas.

segunda-feira, maio 30, 2005

A Civilização e seus Náufragos


Cena de "Um Filme Falado" Posted by Hello

Manoel de Oliveira é português, tem 98 anos, e é diretor e roteirista desde os tempos do cinema mudo. Seu lançamento mais recente é "Um Filme Falado". Não é um grande espetáculo. O ritmo é lento e sonolento e muitos diálogos são tediosos. Mas ainda assim, há nele momentos que me fizeram pensar nas dificuldades da Velha Europa nestes dias turbulentos.

Rosa é professora de História na Universidade de Lisboa e parte numa viagem de navio com a filha, rumo à Índia, onde as duas irão encontrar o pai da menina. O cruzeiro passa por pontos que tiveram papel importante na civilização do Mediterrâneo: Lisboa, Marselha, Nápoles e Pompéia, Atenas, Constantinopla, o Egito das pirâmides e do canal de Suez. Em cada local a mãe dá uma aula à filha sobre os acontecimentos marcantes daquelas regiões.

Na segunda metade o filme se concentra no navio, onde o comandante (John Malkovitch) recebe para jantar mulheres já um tanto idosas que tiveram carreiras de destaque nos negócios, na moda e na arte (interpretadas por Catherine Deneuve, Stefania Sandrelli e Irene Papas). Cada convidado vem de um país diferente, mas todos se entendem através das referências comuns à alta cultura européia. Até o momento em que o navio atravessa o Mar Vermelho e a trama é sacudida por fatos trágicos que se tornaram comuns neste mundo pós-11 de setembro.

A palavra chave para se entender o filme é "civilização". É o conceito que une as aulas de História antiga que a mãe dá à filha aos diálogos sofisticados da mesa de jantar no navio. Todos são muito gentis, cordiais, mas de um artificialismo forçado, frio. As mulheres mais velhas tiveram sucesso profissional, mas vivem uma vida sentimental vazia, sem maridos, filhos ou família e chegam a invejar a jovem professora portuguesa.

Num cineasta com quase 100 anos, não é de espantar que tudo no filme remeta ao passado, às ruínas de Atenas e Roma ou à juventude de beleza e triunfo das mulheres. As conversas seguem tediosas, com lugares comuns. Parecem o testemunho de uma civilização que já passou e não conseguiu se renovar, com personagens náufragos de uma segurança perdida numa Europa turbulenta. E agora desafiada pela violência que irrompe das margens do mundo.

Há várias definições para "civilização" ditas em momentos diferentes do filme. Minha favorita é aquela que não se expressou em palavras, mas pelas ações da protagonista: civilização é uma menina poder brincar em paz com sua boneca. Uma possibilidade tão rara no século XXI quanto nas épocas anteriores.

sexta-feira, maio 27, 2005

Quo Vadis, Europa?


A batalha pela Europa Posted by Hello

Depois de amanhã os franceses votarão no referendo que vai aprovar ou rejeitar o Tratado Constitucional da União Européia. As pesquisas indicam 54% de preferências para o não, com um grande percentual de indecisos (20%) que pode mudar o jogo. Ontem o presidente Chirac fez um discurso em cadeia nacional de rádio e TV conclamando os franceses a assumir uma "responsabilidade histórica pelo futuro da Europa", dizendo que a rejeição à constituição lançaria o continente numa era de incerteza.

As divisões nas sociedades européias com relação ao tratado são grandes. Pelo sim está a maior parte da elite política e burocrática. Pelo não, dissidentes radicais de esquerda e de direita, bem como uma parcela considerável da população, assustada com a estagnação econômica e o desemprego recorde. Pessoas que culpam a UE pelas dificuldades que enfrentam e que sentem as instituições de Bruxelas muito distantes de seus problemas cotidianos.

No seminário em que estive na semana passada, os europeus - todos da extrema-esquerda - se dividiram quanto à questão. Metade condenava o Tratado Constitucional como sendo a consolidação das políticas de abertura econômica e livre-mercado que combatem, um arranjo institucional que favorece as grandes empresas em busca de mobilidade geográfica e economias de escala para competir no mercado global.

A outra metade observava que isso ocorre na Europa desde o início da integração, com a Comunidade do Carvão e do Aço e o Tratado de Roma , ainda nos anos 50. Por que ser contra somente agora? Houve até quem ressaltasse que uma regulação ruim do capital financeiro e das grandes empresas era melhor do que não ter qualquer norma.

Por trás dos debates, as preocupações com o novo quadro geopolítico do continente, a "Europa dos 25" criada com a entrada dos países ex-comunistas. Meus pais acabam de voltar de uma viagem pela República Tcheca e pela Hungria e ficaram chocados com a pobreza que encontraram por lá, bem como o aspecto abatido das pessoas. O euro ainda não foi adotado porque as autoridades temem um surto inflacionário na mudança da moeda, como houve nos países ocidentais.

Como cidadão europeu, eu votaria contra o Tratado Constitucional. Dados os enormes problemas de déficit democrático que observo na Comissão e no Parlamento Europeu, creio que está mais do que na hora da população acender um alerta vermelho em Bruxelas quanto aos rumos da integração. Perguntando no latim que unificou o continente no passado: Para onde vais, Europa?

quinta-feira, maio 26, 2005

Diplomacia da Feijoada

Na segunda, defendi meu projeto de tese. Nos EUA é um rito de passagem, como sabe quem acompanhou os posts de BB. No Brasil, apenas uma formalidade. No mesmo dia, fui sondado sobre a possibilidade de assumir o posto de subeditor de internacional de um jornal carioca. Em outras circunstâncias, teria sido ótimo. Indiquei uma amiga para a vaga.

Na terça, o assessor de imprensa do IBASE me comunicou que o instituto fechou um acordo com o Jornal do Brasil para publicar um artigo por quinzena. Farei parte do grupo de pesquisadores que se revezará no espaço. Devo escrever sobretudo a respeito de relações internacionais.

Na quarta, voei para São Paulo para participar de um fórum da sociedade civil sobre política internacional. Fomos discutir a aproximação Índia-Brasil-África do Sul. O destaque foi o embaixador indiano, que impressionou a todos com uma análise abrangente e brilhante dos diversos aspectos da estratégia de desenvolvimento nacional de seu país. Também nos marcou sua ênfase na autonomia e na soberania (ele tinha idade suficiente para ter vivido o fim da época colonial) em tudo diferente da postura submissa aos EUA e à Europa manifestada pelos representantes oficiais do Brasil presentes ao encontro. Que vergonha dos nossos governantes!

Uma amiga uruguaia com quem trabalhei no monitoramento das conferências sociais da ONU me convidou para almoçar com membros da uma ONG de direitos humanos que realizam um projeto interessantíssimo de intercâmbio com os países da África portuguesa. Adorei a instituição, tocada por um grupo de simpáticas jovens na faixa dos 20 e poucos anos.

Confraternizamos em torno de uma bela feijoada e minha amiga uruguaia e eu aproveitamos para cantar os africanos a participar do monitoramento, em especial de uma edição especial que está em planejamento, e irá abarcar o mundo lusófono. Conversei bastante com eles, perguntando detalhes sobre o intercâmbio, porque me interessei em levar a idéia ao IBASE. Pode ser uma maneira de superar os impasses no projeto de Dialógo com a África, que está emperrado num modelo abstrato, com poucas possibilidades de resultados concretos.

À tarde, o debate no seminário foi marcado pelo depoimento do professor Ricardo Seitenfus, que visitou o Haiti como relator do Itamaraty e evidentemente fez uma defesa da desastrada intervenção do Brasil naquele país. Há um artigo do professor Demétrio Magnoli na Folha de S. Paulo desta quinta, atacando Seitenfus e refutando as posições do governo brasileiro.

Minha intervenção no seminário foi no sentido de que havíamos discutido muito os Estados, mas eu gostaria de trazer questões sobre as organizações da sociedade civil, porque a diplomacia deixou de ser privilégio dos funcionários oficiais e se tornou assunto nosso, com a ascensão de uma nova agenda política. Falei também sobre as dificuldades e oportunidades em meu trabalho com a África. O discurso me rendeu um convite de uma irlandesa que trabalha no PNUD e na Anistia Internacional para fazermos um levantamento ligado aos direitos humanos no Brasil. Devemos almoçar semana que vem para conversar a respeito.

Ainda peguei parte da tempestade que se abateu sobre São Paulo - a cidade e o aeroporto estavam caóticos. Mas consegui voltar ao Rio para um bom descanso nestes dias de feriadão.

quarta-feira, maio 25, 2005

TIMganei

Este blog deve possuir, no máximo, uns sete leitores. Isto é o que sempre repito para mim mesmo assim que alguém se anuncia como leitor(a) e diz que acompanha com freqüência o que o Mauricio, o jd e eu escrevemos por aqui. Como desde o início não há qualquer estatística que indique a leitura, prefiro acreditar que estou, pelo menos, protejendo nossos sete leitores habituais.

Ao chegar no Rio de Janeiro, minha irmã me deu de presente seu celular antigo, que estava meio batido. "Só precisa ir na TIM e trocar de plano. Como você vai ficar por quase três meses, faz sentido trocar para pré-pago." Assim foi feito. Troquei pelos famigerados cartões.

Cena 1: Em uma loja da TIM para fazer uma pergunta técnica. Pergunto para o vendedor o que quero saber e ele responde de bate-pronto, com cara de muxoxo: "Não tenho a menor idéia. Aliás, ninguém aqui têm a menor idéia sobre isso. Sabe o que? Vai na Vivo perguntar..."

Na Vivo?? Na concorrente?? Pois então...

Cena 2: Ligando para o serviço do consumidor TIM.
"Gostaria de resolver este determinado problema..."
"Só com o titular, senhor."
"Mas sou eu que uso este celular. O titular não pode falar no momento."
"Só com o titular, senhor."
"Então eu gostaria de fazer uma reclamação formal."
"Só com o titular, senhor."

Cena 3: Alguns dias depois entro em outra loja TIM para comprar um cartão.
"Quero o cartão de 15 reais, por favor."
"Custa 15,80."
"Tudo bem, me vê um. [Mostrando duas notas de dez]"
"O senhor não tem trocado? Dezesseis reais servem..."
"Tenho. [Mostrando uma nota de dez, duas de dois e duas de um]"
"Vou ficar lhe devendo então os vinte centavos..." [!!!!]
"Caro, sem querer ser chato, prefiro que você me dê meus vinte centavos. Ainda tenho utilidade para eles, se é que você me entende...E a TIM não tem sido a melhor das operadoras para mim... Aliás, posso fazer uma reclamação?"
"Só se o senhor for o titular da conta..."

Ainda estou decidindo quem eu mando matar. De repente eu mesmo, por ingênuo.

segunda-feira, maio 23, 2005

Companheiros

Neste fim de semana estive num seminário do IBASE que reuniu acadêmicos, líderes de ONGs e movimentos sociais para discutir uma agenda política comum. Como um dos organizadores do evento, tive uma oportunidade rara de conviver com militantes veteranos, na faixa dos 45-60 anos, de vários países da América Latina e da Europa, que passaram por experiências dramáticas como a luta contra ditaduras militares ou viveram momentos de importância histórica como a derrocada dos regimes comunistas no Leste Europeu.

De lá para cá muita coisa mudou no mundo. As lutas sociais estão mais fragmentadas e surgiram questões novas ligadas aos direitos humanos, etnia, orientação sexual, meio ambiente etc. Não é fácil para os militantes de outra época se adaptarem a este cenário um tanto confuso. O Fórum Social Mundial é a principal tentativa em andamento.

O debate político mais interessante do seminário ocorreu entre os participantes europeus, absolutamente divididos com relação ao Tratado Constitucional da UE, que está em votação. Escreverei mais sobre isso ao longo da semana, por ora marco que as conversas que tive me mostram o quanto preciso aprender sobre as questões comunitárias da Europa. A fundação alemã com a qual trabalhamos contratou uma jovem cientista política brasileira que fez mestrado na Alemanha e batemos papos interessantes sobre a situação do país após a queda do muro. Estou tentando convencê-la a cursar o doutorado no IUPERJ.

Outro ótimo convívio foi com um colega colombiano, amigo de Garcia Márquez. Ele me contou ótimas anedotas sobre o escritor e conversamos sobre literatura hispano-americana, falando de Cortázar, Carpentier, Vargas Llosa, Juan Rulfo, entre outros. Concordamos que o Fórum Social deveria dar mais importância à cultura e até pensamos em algumas possibilidades para a próxima edição do evento, que será na Venezuela daqui a 6 meses.

No sábado à noite fizemos uma excelente festa à beira da piscina. Um dos participantes, um chileno que militou junto aos índios mapuche, tomou o violão e nos brindou com os clássicos do cancioneiro hispano-americano: Mercedes Sosa, Violeta Parra, Victor Jara, Pablo Milanés. Ouvir um sobrevivente das torturas de Pinochet cantar “Gracias a la Vida” mexe com qualquer um.

Depois um alemão se entusiasmou e tocou as músicas da Alemanha Oriental nos anos 60, que nos surpreenderam pelo tom jovial e alegre. “Eles estavam concectados!”, exclamou um espanhol. Como nosso colega vivera alguns anos em Moscou, ouvimos também canções soviéticas. O italiano atacou com os hinos da luta anti-fascista, “Bella Ciao” e “Bandiera Rossa”. Terminamos a madrugada meio bêbados cantando a “Internacional” em várias línguas. Esquerda festiva assumida.

Apesar da diferença de idade (ou talvez por causa dela) todos foram muito gentis comigo, elogiando meus esforços na organização do seminário e as traduções que fiz do inglês e do espanhol. Os dois diretores do IBASE presentes no evento insistiram para que na próxima edição eu participe como um dos palestrantes, porque eles querem ouvir “a voz da nova geração”.

O que me arrumam... Não tenho nenhuma grande idéia, proposta ou visão, a prática de jornalismo e de ciência política me habituou a focar e a me especializar. Por ora apenas aprendo com os mais velhos, admirando seu idealismo e dedicação. Mas tendo claro que o desafio da minha geração é outro. Há 5 anos disse em meu discurso de formatura que não estamos mais em 1968, é preciso sonhar um sonho novo. Continuo a pensar assim.

quinta-feira, maio 19, 2005

Bolívia: a disputa pelo gás


Sindicatos protestam na Bolívia Posted by Hello

O Bruno me pediu comentários sobre a crise na Bolívia. O estopim é a disputa pelo gás natural, que é extraído por empresas estrangeiras, sendo que a maior é a Petrobras, na qual trabalha meu amigo. Ele escreveu um post sobre o assunto. Eu tinha tratado do tema no artigo para o Globo, criticando o comportamento da empresa brasileira com relação ao meio ambiente e à responsabilidade social.

A Bolívia é um país com população muito pobre, mas território rico em recursos naturais: prata, estanho e gás natural. Mas a riqueza permanece concentrada nas poucas empresas que exploram esses recursos, e nos bolivianos associados a elas. Seu poder é imenso: a Petrobras é a maior pagadora de impostos da Bolívia. Sem ela, o fisco quebra.

Nesta semana o Congresso boliviano aprovou após longos debates uma Lei dos Hidrocarbonetos que aumenta os impostos e royalties sobre o gás de 18% para 50%. As empresas estrangeiras, Petrobras inclusive, reagiram dizendo que vão repensar seus investimentos no país. O presidente Carlos Mesa não vetou nem aprovou a lei: simplesmente a mandou de volta ao parlamento, lavando as mãos como Pilatos. Grupos mais radicais querem expulsar as corporações estrangeiras. Houve até um atentado terrorista contra a Petrobras.

A maioria da população é de origem indígena e como em outros países da região andina os índios começaram a se organizar em partidos. Seu líder mais importante é o aymará Evo Morales, do Movimento ao Socialismo, o segundo mais votado nas últimas eleições presidenciais e o favorito para as próximas, em 2007. Morales joga com uma agenda mais ampla do que a etnia: articulou uma aliança entre índios, sindicatos e os pequenos proprietários rurais plantadores de coca. Querem maior controle sobre o gás natural para implantar reformas sociais. Há também um partido puramente indígena, o Pachakutik, liderado pelo quéchua Felipe Quispe, que controla 5% do parlamento.

O mais provável é que Mesa não complete o mandato e renuncie ou tente antecipar as eleições. Acho que o Brasil irá buscar entendimentos com os bolivianos, que dependem demais do mercado brasileiro para pensar seriamente num rompimento de contrato. Acerta-se um aumento nos impostos sobre os estrangeiros que permita aos políticos locais sobreviver à fúria do eleitorado e está tudo resolvido.

Dois bons links para a crise boliviana: “História Sem Fim”, um artigo escrito por meu orientador, que é consultor da Petrobras para assuntos de política sul-americana; e também uma análise do argentino Rosendo Fraga, sobre “Impacto Regional de la Crisis Boliviana”.

Viajo daqui a pouco para Rio Bonito, estou organizando um seminário internacional num hotel fazenda na região. Volto domingo à noite, defendo meu projeto de tese na segunda-feira e em seguida embarco para São Paulo, para outro evento do mesmo tipo. Imagino que conseguirei descansar no feriadão.

quarta-feira, maio 18, 2005

América Maiúscula

Ontem à tarde dei uma entrevista para a Rádio Nacional Alemã sobre a situação política na América Latina. O correspondente no Brasil havia lido um artigo que escrevi sobre o descompasso entre movimentos sociais e governos no continente e batemos um papo que passou por temas como a vitória da Frente Ampla no Uruguai, a formação do G-20, as mobilizações na Bolívia e no Equador e, claro, os dilemas do governo Lula. Disse ao jornalista alemão que num país decente alguns dos políticos aliados do PT não estariam no ministério, mas na cadeia.

Meu interesse pela América Latina - América Maiúscula como diria Guevara - está cada vez maior. As três viagens que fiz pelo continente em 2004 resultaram em colocar o Mercosul como tema da minha tese de doutorado e despertaram uma série de leituras e questões de pesquisa sobre a política em nosso continente. Agora reúno material para um artigo sobre a crise de 2001 na Argentina.

O curso intensivo de espanhol que terminei semana passada foi outro passo importante nesse caminho. Aprender uma língua estrangeira não é apenas ganhar um instrumento de conhecimento, é também ter acesso a outras sensibilidades. O bom momento vivido pelo cinema argentino tem ajudado bastante.

Estudar este continente belo e sofrido é uma aposta de que ao fim descobrirei coisas interessantes também sobre o Brasil, mais do que se me dedicasse às teorias abstratas que alguns dos meus professores do doutorado insistem em me empurrar. Também é um projeto mais amplo de ajudar a remediar o que considero a grande falha das ciências sociais brasileiras: a dificuldade de pensar nosso país no conjunto da América Latina. Temos muitos estudos comparativos do Brasil com os EUA, ganharíamos se fizéssemos o mesmo com a Argentina ou o México.

segunda-feira, maio 16, 2005

Dura Lex Sed Lex


Meus diminutivos favoritos Posted by Hello

Um de meus amigos cientistas políticos me enviou um artigo de um especialista célebre em nossa área dizendo que a degeneração do Congresso na Era Severino colocou a democracia brasileiro em perigo. Respondi-lhe dizendo que essa histeria é boa para vender jornal, mas que na semana passada nosso jovem regime democrático deu duas provas de vitalidade, ambas vindas do Poder Judiciário:

1) O STF abriu investigações sobre o presidente do BC, Henrique Meirelles, e sobre o ministro da Previdência, Romero Jucá, frustrando as tentativas do Planalto em abafar as suspeitas contra ambos. O Foro privilegiado no Supremo não resultou em impunidade. Pelo contrário, parece ter agilizado as investigações.

2) Uma decisão da Justiça Eleitoral de Campos tornou inelegíveis o casal Garotinho e substituiu o prefeito da cidade. A juíza sabe o que o trio maravilha fez no verão passado.

Há cerca de um ano realizamos um ótimo seminário no IBASE com juízes da Justiça Eleitoral e jornalistas que participavam da cobertura das eleições municipais. Fiquei muito bem impressionado com os magistrados - jovens, dinâmicos e com vontade de colocar a casa em ordem. Acompanho um pouco dessa renovação do judiciário brasileiro através do meu irmão e de seus amigos, em quem vejo muitas dessas características. Meu mano costuma dizer que os jovens juízes "têm uma mentalidade mais aberta, falam muito em cidadania e democracia."

Não há mistério. As carreiras jurídicas são as mais bem pagas do funcionalismo público brasileiro e a entrada nelas se faz por concursos rigorosos. Mão-de-obra qualificada, estabilidade, bons salários, proteção contra desmandos políticos. A mesma receita que criou boas instituições em outros países. O Brasil está mudando. O desafio agora é melhorar a base do sistema, porque não adianta ter excelentes juízes e uma péssima polícia.

domingo, maio 15, 2005

A Queda


Bruno Ganz como Hitler Posted by Hello

Neste domingo vi "A Queda - as últimas horas de Hitler" e fiquei decepcionado com o filme. Embora Bruno Ganz esteja muito bem no papel do ditador alemão, o enredo se arrasta por duas horas e meia, desenvolve pouco os personagens secundários e usa alguns truques melodramáticos que me desagradaram.

Como capturar o espectador para se identificar com o grupo de calhordas e fanáticos que constituía a elite do regime nazista? O que o roteiro faz é jogar com a simpatia do público por dois personagens "normais" que se distinguem no meio da lama e da podridão do bunker de Hitler: sua jovem e ingênua secretária e um médico das SS que mantém ética e senso de responsabilidade mesmo em meio ao colapso do III Reich. Chegamos a torcer para que sejam bem-sucedidos e escapem com vida do pesadelo.

Um cineasta mais ousado teria forçado o espectador a encarar o que existe de monstruoso dentro de cada um de nós e adotar a perspectiva dos vilões. Quem conhece "Ricardo III" de Shakespeare sabe o quanto esse recurso pode ter impacto emocional.

O mais interessante do filme aparece em segundo plano - a batalha pela capital alemã. Há poucos meses li um livro magistral sobre o assunto, "Berlim 1945: A Queda", de Antony Beevor, que narra episódios parecidos com aqueles mostrados no filme, só que muito mais brilhantismo, abordando tanto o comportamento da cúpula nazista quanto o dos civis e cidadãos comuns. No cinema é inclusive difícil distinguir quem é quem no círculo íntimo de Hitler, personagens vitais como Albert Speer e Heinrich Himmler aparecem de modo muito superficial, todos parecem iguais em seus uniformes.

Os russos que sitiam Berlim são quase fantasmas no filme, opção curiosa que funciona para criar suspense, mas sua aparição acaba sendo frustrante. De novo, chama a atenção o contraste com o livro de Beevor, em que a descrição do comportamento do Exército Vermelho é tão apavorante que cheguei a ter pesadelos, e depois li uma entrevista do autor em que ele confessa ter passado pela mesma experiência enquanto escrevia.

sexta-feira, maio 13, 2005

Miragem Diplomática


Brincando de superpotência Posted by Hello

A política externa brasileira está num momento confuso. Atira para todos os lados ao mesmo tempo e o resultado são trapalhadas como a cúpula América do Sul-Liga Árabe, que criou confusão em temas sensíveis como democracia e terrorismo, adotando posições que são um retrocesso de 20 anos na agenda diplomática brasileira. Enquanto isso, relações bilaterais importantes como aquelas com os EUA e a Argentina, saem prejudicadas.

Por seu tamanho, população e dimensão econômica o Brasil tem um papel de relevo a desempenhar na política internacional. Desde os dias da Liga das Nações nossas elites aspiram a maior destaque nessa arena. A demanda é justa, mas infelizmente esse desejo raramente vem acompanhado de reformas sociais internas ou de medidas concretas para fortalecer o país.

No governo Lula, a diplomacia com freqüência é utilizada como uma compensação simbólica para a ortodoxia na política econômica. Do tipo: "vocês podem estar chateados com os juros altos e os cortes do Palocci, mas vejam como estamos fazendo bonito na África e na ONU". Jânio Quadros fez algo semelhante quando implementou a política externa independente no início dos anos 60 e o presidente Arthur Bernardes agiu na mesma direção quando pleiteou uma vaga no Conselho Permanente da Liga das Nações. Ambos acabaram mal.

A diplomacia de Lula conquistou muitos sucessos importantes, como a formação do G-20 na Organização Mundial do Comércio, mas está cada vez mais presa de uma armadilha criada pelas contradições do governo. O Itamaraty gera expectativas altas demais, impossíveis de serem cumpridas, porque os problemas internos são muito grandes. Nos anos 70, o Brasil tinha uma política externa afirmativa, mas que estava baseada no crescimento econômico acelerado. A situação hoje é diversa. Já aconteceram fatos constrangedores, como o chanceler discursar na Síria contra a ocupação israelense e no mesmo dia cortarem a luz do Ministério das Relações Exteriores por falta de pagamento.

Em tempos de recursos escassos, o melhor seria selecionar as áreas prioritárias e concentrar os esforços nelas. Isso envolveria o aprofundamento do Mercosul, com a coordenação da política econômica e a redução dos atritos com a Argentina. Também seria o caso de reformular a caótica estrutura do comércio exterior brasileiro, fragmentada em diversos ministérios (Relações Exteriores, Fazenda, Desenvolvimento e Comércio Exterior, Agricultura etc), visando à melhor organização do potencial negociador. Mas aí implica definir um projeto nacional de desenvolvimento e tomar decisões que desagradarão grupos influentes. Mais fácil ficar com retóricas e miragens.

quinta-feira, maio 12, 2005

A Ameaça Nuclear Norte-Americana

Para quem lê este humilde blog há algum tempo, é fato notório que eu gostei muito do filme "Sob a Névoa da Guerra" de Errol Morris. A entrevista concedida a Morris por um envelhecido Robert McNamara é um primor de sutileza e uma aula inacreditável de Política Externa Norte-Americana.

McNamara acabou de escrever um artigo na revista Foreign Policy sobre armas nucleares e a estratégia norte-americana atual de dissuasão nuclear. O mais interessante do artigo não é o fato de que as armas nucleares podem ser perigosas, mas de quem o declara tão abertamente. É impossível ler o artigo e não lembrar daquela cena no filme em que McNamara levanta a mão e indica entre o indicador e o polegar o quanto faltou para o holocausto nuclear durante a crise dos mísseis cubanos. Assustador.

quarta-feira, maio 11, 2005

Clima(s), Percepções e Acentos!

Mudar de país é mudar de clima. Em todos os sentidos. O tempo é diferente, assim como a reação das pessoas. Chegar ao Brasil tem este efeito em mim - aqui as pessoas se comportam de maneira tão diferente que às vezes me sinto como se estivesse em outro planeta. E aqui não vai nenhuma crítica especifíca ao Brasil, muito pelo contrário. Aqui vai então um post sobre várias coisas ao mesmo tempo, aproveitando o relaxamento da disciplina do Primeiro Mundo.

Sei que este é um tema assaz estranho para este blog, mas a Gloria Perez enlouqueceu: o tal núcleo mexicano da novela das oito tem tanto a ver com o México como eu tenho a ver com Tuvalu. Não só achei ridículo, como ofensivo. Então, os mexicanos são uns panacas e fica por isso mesmo. Estamos muito longe realmente de entender os outros latino-americanos...

Aliás, falando de latino-americanos, acompanhei daqui a Cúpula dos Países Sul-Americanos e dos Países Árabes. Acho que o Mauricio não vai concordar comigo, mas achei que a cúpula foi bastante inútil. O que era realpolitik na década de 70 virou hoje um pastiche. Entendo que o Brasil queira se firmar como "líder natural" da região, mas badalar os países árabes? Claro que não sou ingênuo, sei da questão do petróleo, da histórica colônia árabe no Brasil, dos laços fraternos que nos ligam ao Líbano e a Síria, etc. Mas, no final, produziu-se um documento completamente inócuo pregando a boa vontade entre os povos, o Lula falou da fome, o Chavez deu showzinho, o presidente da Argélia exortou a criação do Estado Palestino e todo mundo comeu e bebeu as custas do erário no belo Hotel Blue Tree Park em Brasília enquanto o mundo continua o mesmo, muito obrigado.

Acho que, no fim, o Nestor fez muito bem: veio, sentou, cumprimentou a todos e voltou para Buenos Aires para trabalhar. Deve ter sido a demissão do Passarella. Dizem as más línguas que foi este o estopim da crise.

(PS -- Para os que acompanham este blog há muito tempo, uma notinha inútil porém pitoresca. Este post tem acentos! Isto tudo graças a boa vontade da minha irmã, que volta e meia me empresta o computador que possui um teclado adequado. Os erros de acentuação que por ventura notarem, desculpem do fundo do coração. Três anos sem acentuar absolutamente nada deixam um rastro perverso...)

(PPS -- Para aqueles que não compareceram à reunião dos Conspiradores promovida em dezembro último, parece que desta vez estou perto de conhecer alguns de vocês. Mais informações com o Mauricio em comunicação futura. Abraços.)

O FGTS é seu amigo

Objetivo do cidadão incauto: sacar R$5 mil do fundo de garantia para dar uma mão na compra do apartamento

CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (CEF), 2 de maio. Antes da assinatura do contrato.

FUNCIONÁRIA 1: É simples, o senhor precisa somente trazer os documentos desta lista e em cinco dias úteis o dinheiro está na sua conta.


CEF. 6 de maio. Apresentação dos documentos.

FUNCIONÁRIO 2: Ih, é para FGTS? O senhor tem que agendar uma audiência com o gerente. Só daqui a 25 dias.

Segunda tentativa:

FUNCIONÁRIA 3: FGTS? Vá até o fundo da agência e converse com um dos gerentes. Tempo de espera? Uns 15 ou 20 minutos, depende da fila.

GERENTE 1: O senhor é correntista do Banco do Brasil? Então é melhor resolver por lá.


BANCO DO BRASIL (BB), 9 de maio.

FUNCIONÁRIO 4: FGTS é com a caixa.

FUNCIONÁRIO 5: O BB não faz isso. O gerente da CEF informou errado.


CEF, 9 de maio. Cerca de três horas depois.

GERENTE 2: De fato, o senhor tem que marcar audiência com o gerente e apresentar vários documentos. Depois um engeheiro vai vistoriar o apartamento. Mas só temos horário para audiências a partir de setembro. E o senhor vai pagar de taxas algo em torno de R$1 mil. No seu lugar, eu não mexeria no FGTS agora. Sim, o senhor pode resolver pelo BB ou por qualquer outro banco. É que eles não sabem disso e ficam mandando todo mundo para cá, por isso estamos lotados.

BRADESCO. 9 de maio. Uma hora depois, por telefone.

FUNCIONÁRIA 6: Fazemos esse serviço, mas não recomendo ao senhor. A burocracia é complicada, tudo corre por São Paulo, e a taxa inicial é de R$1.300.


BB, 11 de maio.

GERENTE DE RELACIONAMENTO: FGTS pelo BB? Isso para mim é novidade. Eu mesmo estou quitando meu imóvel pela CEF e resolvendo tudo por lá. Mas o atendimento deles é uma porcaria. Esperei 1h40 na fila. E ainda cobram uma taxa de avaliação no valor de 1% do apartamento. Peraí, deixa eu ver se o Freitas sabe alguma coisa.

FREITAS: Não, a gente só faz o acompanhamento do FGTS quando é em caso de demissão. Na divisão de tarefas, o BB e a CEF não podem competir na área imobiliária. Não sei porque eles ficam mandando as pessoas para cá.

GERENTE DE RELACIONAMENTO: O senhor vai comprar o imóvel com cheque administrativo? Ah, com transferência eletrônica direta, porque só paga o CPMF e escapa da taxa do Banco Central... Como o senhor sabe disso, o senhor trabalha em banco? É, verdade, é importante a gente estar bem informado.

***

Moral da história: é mais fácil mexer comigo do que eu mexer no meu FGTS. Deixa ele lá. Mas confesso que se alguém assaltar uma agência da CEF, não ficarei triste.

segunda-feira, maio 09, 2005

Questão de Interpretação


Kidman em "A Intérprete" Posted by Hello


Na semana passada li um romance e vi um filme protagonizados por intérpretes, que simbolizam as dificuldades da ONU em lidar com as crises internacionais, em particular na África.

A personagem título de "A Intérprete" é uma funcionária da ONU vivida por Nicole Kidman. Ela ouve um dialogo num dialeto aficano que aponta para uma conspiração para matar o presidente do Matobo, que irá discursar na Assembléia Geral. O político havia sido o líder de um movimento de libertação, mas se transformou num tirano genocida - descrição que poderia se aplicar a Mobutu (Zaire) ou Mugabe (Zimbabwe), entre outros ditadores africanos. A França quer levá-lo ao Tribunal Penal Internacional e os EUA se opõem - eles não gostam do sujeito, mas como não reconhecem o tribunal não podem dar-lhe legitimidade.

A intriga política é bem construída e complementada pela atuação de Sean Penn, que interpreta o agente do seviço secreto encarregado de investigar a ameaça. À medida que conhece a personagem de Nicole, ele encontra um passado nebuloso de ativismo e suspeita do envolvimento dela em algum tipo de conspiração na África.

Embora o roteiro tenha furos, consegue prender a atenção e é uma defesa da ONU e da diplomacia, mesmo que os caminhos das palavras sejam mais longos e tortuosos do que os das armas. Há um belo diálogo entre um policial e a personagem de Nicole que resume o lema do filme:

"Por que você veio trabalhar na ONU?"
"Porque acredito em sua missão."
"Sim, mas com todo o respeito, você é apenas uma intérprete."
"Países foram à guerra porque interpretaram mal as ações uns dos outros."

O romance de Mia Couto, "O Último Voo do Flamingo" é protagonizado por um rapaz moçambicano que serve de intérprete para um militar italiano, que está com as tropas da ONU no país. Os dois investigam uma série de fatos bizarros: soldados das forças de paz explodem, e restam apenas seus órgãos sexuais. O soldado fala português: o que ele não entende é Moçambique, com sua lógica que desafia os padrões europeus e cartesianos (depois o leitor descobre que o italiano também não é tão cartesiano assim...).

O enredo usa e abusa do realismo mágico, gênero literário que raramente me agrada. Alguns personagens são clichês puros, como o administrador corrupto da vila onde se passa a ação. Mas a beleza da prosa de Couto, com freqüência comparado a Guimarães Rosa, vale a leitura. Ao fim, o que se tem é uma espécie de fábula amarga sobre a esperança - mesmo a perdida.

sexta-feira, maio 06, 2005

História Oral dos Santoro

Livremente inspirada na “Breve História Oral de Brasília”, de João Moreira Salles e Raquel Zangrandi, publicada no site NoMínimo.

MÃE (ao professor de hidroginástica): “Meus dois filhos resolveram me abandonar. Vão me deixar sozinha, com o cachorro.”

PRIMA RICA (para a TIA): “Vou mandar o juiz despejar você do seu apartamento, porque sou dona de 10% dele e não conseguimos vender o imóvel do primeiro andar.”

EX-TIO (para a TIA): “Não se preocupe. Minha casa é sua e você pode voltar na hora que quiser.”

IRMÂO ADVOGADO (para a TIA): “A Justiça não funciona assim. O juiz não é empregado da nossa prima.”

PRIMA POBRE (para a MÃE): “Não vou vender minha parte no primeiro andar. Quero f... o [PRIMO GAY].”

MÃE: “Sim, mas lembre-se que o [PRIMO GAY] pode f... você.”

MÃE (para colega da hidroginástica): “Tem um apartamento à venda no meu prédio, e está uma pechincha. Mas eu recomendo que antes de vê-lo você contrate um excelente advogado.”

MÃE (para a TIA): “Vou dar um chá para comemorar meu aniversário, mas te aviso logo que vou convidar o [PRIMO GAY] porque ele se lembrou da data e até ligou para me dar os parabéns. Se você quiser vir, saiba disso.”

PADRINHO (em lágrimas, ao saber que o afilhado comprou um apartamento): “Menino de ouro, menino de ouro!”.

TIA (para o sobrinho): “Gostei muito do seu artigo que saiu no Globo. Recortei e fico mostrando para minhas amigas, dizendo ´até eu, que sou burra e não entendo nada, consegui saber do que se trata.´ ”

EX-TIO (para o sobrinho): “Você devia ter aceito a proposta do corretor em fraudar o imposto de renda com um valor inferior ao da compra. Você teria economizado um bom dinheiro.”

PRIMO GENTE BOA: “Ouvi dizer que você vai sair de casa. Posso ficar com o seu quarto?”

Primeiras Impressoes

Acabei de voltar ao Rio de Janeiro. Essas visitas periodicas sao estranhas -- pouco a pouco vou recuperando o jeito carioca e o ritmo da cidade. Jah nao estranho mais as pessoas falando em portugues em volta de mim em lugares publicos e isso me tranquiliza.

Vi pela primeira vez o Severino na televisao, assim como a nova novela do Miguel Fallabela (ambos atrozes). O cenario do RJTV mudou, assim como a irma do Faustao. E quando ligo a TV de noite, vejo que a novela se passa nos EUA de onde tento fugir um pouquinho. Eu nao mereco a Gloria Perez.

O transito do Rio piora a cada vez que eu venho, assim como a pobreza. Dos Garotinhos aos Cesar Maias, estamos bem servidos.

Mas isso tudo compensa quando a luz do Rio entra pela janela de manha e nos encontramos com as pessoas que sao queridas. Isso faz toda a diferenca.

Eh bom estar de volta. Abracos a todos!

quinta-feira, maio 05, 2005

A Maior das Distâncias

A maior distância que conheço é aquela que separa a teoria da prática. O IUPERJ tem uma longa e respeitável tradição no estudo da democracia, mas infelizmente muito menos desenvoltura em praticá-la. Nesta semana o instituto está em eleições para escolher a nova direção e a campanha se transformou numa troca de ofensas do pior nível, que quase descambou em violência física.

O pomo da discórdia é a crise do instituto, que vive dos recussos repassados pela Cândido Mendes. Com as dificuldades da universidade, a grana secou e os professores chegaram a ficar vários meses com salários atrasados. A chapa da oposição veio com a proposta de buscar alternativas fora da Cândido. A da situação defende a procura de uma solução dentro do quadro institucional. Debate legítimo entre posições diversas, é quase um exemplo do que é democracia. Note-se que é a primeira vez em muitos anos que aparecem duas chapas, em vez de uma só.

Logo começaram os problemas, numa troca furiosa de e-mails pela lista de discussão do IUPERJ. A chapa da oposiçao acusou a situação de agir de maneira desleal e anti-democrática e se retirou da eleição. Ao mesmo tempo, os estudantes começaram a brigar entre si, por conta de questões pessoais ligadas à disputa do controle do Fórum dos Alunos. Um rapaz mandou uma colega ler Platão, "porque vive no mundo das Idéias". Depois circulou um e-mail assinado pelo próprio Platão pedindo para não ser citado em vão.

O clima no instituto está ruim. Professores de chapas rivais trocaram xingamentos e insultos aos gritos. Fala-se na saída de alguns deles, que não estariam dispostos a continuar. A plataforma de um dos candidatos, afixada no mural, foi pixada com um "viva a tirania!". Muitos alunos estão declarando voto nulo em protesto contra a situação. Eu me abstive de votar.

O IUPERJ é a instituição que mais amo neste mundo. É um lugar onde gosto de todas as pessoas, da senhora que serve o cafezinho ao diretor. Me dói ver as coisas degenerando dessa maneira, em especial porque há professores que admiro muito nos dois campos em disputa. Mas como sabe qualquer cientista político, a democracia é sempre um processo longo, demorado, enrolado e difícil. Se nem a Atenas da era dourada escapou de golpes e desvios, quem dirá o fado destes pobres mortais num país meio atravessado.

terça-feira, maio 03, 2005

Colheita

Assinei na manhã desta terça o contrato de compra do meu apartamento. Paguei o sinal e daqui a dois meses desembolso a parcela restante. Dois meses depois, é a entrega das chaves.

A ficha caiu? Ainda não. Por ora a cabeça está repleta das (muitas) tarefas burocráticas necessárias para concretizar a venda e para liberar o dinheiro do FGTS. Mas ao mesmo tempo fica uma sensação de alívio e tranqüilidade. A busca do apartamento foi minha principal preocupação ao longo do último ano e o resultado final me agradou imensamente.

Daqui até a julho, além da compra do imóvel, muita coisa importante vai acontecer na minha vida. Sábado estréio como professor universitário, lecionando na pós-graduação em relações internacionais da Cândido Mendes. Daqui a um mês completo 27 anos, embora corra o risco de nem perceber, no meio de tanta agitação. Duas semanas depois, termino a última matéria do doutorado - embora ainda restem 2,5 anos para escrever a tese. E por fim, mas não menos relevante, em julho terei minhas primeiras férias em dois anos.

Chegou o tempo da colheita.

domingo, maio 01, 2005

Descompasso Sul-Americano


Mais um presidente que cai... Posted by Hello

No ano passado estive no Equador para participar do Fórum Social das Américas. A viagem foi excelente e despertou minha atenção para os novos atores políticos na região andina, em especial o movimento indígena - cheguei até a entrevistar uma de suas líderes, Nina Pacari, que foi ministra das relações exteriores nos primeiros seis meses do governo Gutierrez. Fiquei impressionado em como aquele pequeno país reúne de modo tão intenso as contradições e possibilidades de nosso continente.

Há alguns dias conversei sobre a situação equatoriana com minha mestra Maria Regina e daí escrevi um artigo sobre o "Descompasso Sul-Americano", analisando as crises no Equador e na Bolívia como um desequilíbrio entre sociedades que se tornaram muito mais democráticas e um sistema político-partidário que não conseguiu acompanhar as mudanças.

Hoje à noite vou rever "Diários de Motocicleta", que é a atração deste domingo no Cine Santa. Gostei imensamente do filme, a narrativa da viagem mochileira que Guevara fez pela América do Sul quando era um jovem estudante de medicina. Muita coisa permanece igual no continente, mas há muitos fatos novos também. No geral, apesar das aparências, acho que a transformação é para melhor. Reproduzo a conclusão de um artigo mezzo crítica de cinema, mezzo análise política que escrevi sobre os Diários:

"Se o Che dos anos 60 era o mártir da guerrilha, nos primeiros anos do século XXI os latino-americanos redescobrimos um Ernesto que nos lembra valores importantes: inquietude diante da vida, revolta perante as injustiças, necessidade de superar os limites estreitos da classe social e da nacionalidade, vontade de compreender a América Latina em seu conjunto. Que tudo isso possa nos ajudar a pensar o presente e sonhar o futuro deste continente tão sofrido quanto belo, desconhecido e sedento de dias melhores."
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