Nacionalismo, proibido para menores
Há duas semanas o embaixador Alberto da Costa e Silva deu palestra em que acusou “a teoria das nacionalidades, essa invenção dos intelectuais alemães” de criar a ilusão de que é possível e desejável ter um Estado etnicamente homogêno, que seja o instrumento por excelência da representação política de um povo.
Poucos Estados do mundo tem esse nível de homogeneidade. Talvez nenhum. O nacionalismo muitas vezes começa com a (re)descoberta de costumes comuns – contos de fada, canções camponesas, revalorização de um idioma, etc - e termina em massacres e genocídio em busca de um ideal de “pureza” (com muitas aspas, por favor) inatingível.
Por quase dois mil anos os judeus tentaram a assimilação nas sociedades européias e americanas, sonho sepultado em Auschwitz. Theodor Herzl pensou pela primeira vez em recriar o Estado judeu ao cobrir como jornalista os ataques anti-semitas durante o Caso Dreyfus, na conturbada França do início do século XX. Se nem no país da Revolução e do secularismo os judeus poderiam estar em paz, então onde?
A partilha da Palestina pela ONU, em 1948, nunca foi respeitada por nenhum dos lados em guerra. Como diria Garrincha, faltou combinar com os russos. Ou no caso, os árabes. Pagaram a conta dos crimes cometidos por alemães, franceses, poloneses, italianos, húngaros e quantos mais contribuíram para o genocídio na Europa. O movimento sionista dizia “uma terra sem povo para um povo sem terra.” Claro que tamanho desrespeito aos palestinos ia acabar mal. Os árabes tampouco criaram o Estado para eles, seu território foi dividido entre Egito e Jordânia. E Israel apoderou-se pela força de mais espaço do que lhe davam os tratados.
Quase 60 anos se passaram desde então, com seis guerras árabe-israelenses (contando o atual conflito como a sexta), duas revoltas palestinas nos territórios ocupados da Cisjordânia e Gaza e um sem número de ataques terroristas e operações clandestinas.
No fim de semana, conheci um casal de jornalistas que estudaram em Israel e tivemos uma excelente conversa sobre o país. Lá pelas tantas eles me perguntaram como eu imaginava o futuro do Oriente Médio.
“Sendo razoavelmente otimista, acho que em 200 ou 300 anos os historiadores olharão para esta época mais ou menos como vemos as guerras religiosas entre católicos e protestantes”, respondi.
“Pode ser, mas lembre-se que a tecnologia que os católicos e protestantes usavam para se autodestruir era bem menos avançada do que as armas atuais”, lembrou o rapaz.
Mas há reações contra a guerra em ambos os lados do conflito.
Em Israel, grupos pacifistas e ativistas de esquerda protestam contra o governo. A resposta dos compatriotas costuma ser agressiva, mas concordo com o jornalista Gideon Levy, que diz preferir o ódio à indiferença: “Assim, pelo menos se cria uma discussão na sociedade, e a violência das reações indica rachaduras no consenso. As pessoas começam a ter dúvidas se realmente estão com a razão, pois quem tem segurança de suas posições não grita, é capaz de falar calmamente."
No Líbano, o testemunho de um homem que trabalha num centro de assistência humanitária e precisa lidar com as tensões e conflitos entre os vários grupos religiosos que atende. Ele narra a seguinte discussão:
“Quanto os sírios estão te pagando, seu idiota!!!? Volte para onde você pode votar, seu filho da puta”
“Não tanto quanto os americanos te pagam, seu canalha”
“Foda-se o Hezbolá”
“Não, foda-se você”
Escreveu: “Está cada vez mais assustador e comum esbarrar em cenas como essa, todos os dias. Você só precisa andar pela rua e escutar.”
Na foto, crianças israelenses escrevem mensagens em mísseis que serão disparados no Líbano. Elas haviam saído de bunkers onde se escondiam dos ataques do Hezbolá.
3 Comentarios:
A situação no Oriente Médio é assunto de discussão todos os dias e em todos os lugares por aqui. Hoje mesmo estava falando sobre isso com meu chefe. A maioria dos britânicos é contra a posição do governo de não condenar as ações de Israel, e o jornal The Independent de sexta passada teve uma capa genial - http://angusabranson.livejournal.com/570764.html
Beijos!
Belíssima capa, Nica. Obrigado pelo link!
Estou acompanhando a guerra principalmente pela imprensa britânica e francesa, que têm os melhores repórteres no Oriente Médio.
Vamos ver se a visita do Blair ao Bush consegue alterar a atitude dos EUA e avançar na proposta de cessar-fogo.
Igor,
bem, nacionalismo é o seu tema... Dê uma olhada no artigo do historiador Timoty Garton Ash (britânico, é claro) sobre como o nacionalismo europeu criou a estrada que leva à guerra no Oriente Médio.
http://www.guardian.co.uk/israel/comment/0,,1831150,00.html
Abraços
Mestre Idelber,
Muito obrigado pelo cumprimento e pelo link para os textos. Sigo acompanhando seus posts sobre o Grande Sertão e cá entre nós às vezes me pergunto se não deveria ter ido estudar algo mais nobre e belo como a literatura.
Abraços
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