Medo, Desconfiança e Indiferença
A vitória do não no referendo do desarmamento foi avassaladora e atravessou todas as camadas sociais e regiões do país. Três sentimentos me parecem decisivos para esse resultado:
1 - Medo: o Brasil é inseguro e as pessoas acham que é melhor ter uma arma para se proteger, ou ao menos fazer com que os bandidos pensem nessa possibilidade antes de invadir uma casa.
2 - Desconfiança: o Estado não é capaz de garantir a segurança. Nessa perspectiva também não é possível confiar nos vizinhos ou na comunidade. O indívudo pode contar apenas consigo mesmo. Essa posição representa ainda o ceticismo quanto às razões do referendo ("O que eles [políticos] querem com a gente? O que estão aprontando?") e com certeza a frustração com o governo Lula influiu na vitória do não.
3 - Indiferença: Os dados sobre homicídios por armas de fogo foram bastante divulgados durante a campanha e uma boa parte da população sabe que a maioria ocorre por motivos fúteis em brigas entre amigos, conhecidos e parentes, acidentes com crianças etc. Mas essa não foi a questão do referendo. Sejamos francos: as pessoas não se importam com o que acontece com as outras, só com o que se passa em seu círculo íntimo. Daí vem um argumento que foi forte durante a campanha: "se os outros não sabem usar suas armas, problema deles, eu cuido da minha".
Poderia ser diferente? O Brasil é um dos países mais desiguais do mundo e nenhum sistema social como este se sustenta sem a indiferença como um de seus pilares.
Uma amiga cientista política, educada em grande parte na França, resumiu bem o que sinto nesta manhã de segunda: "de repente, eu tenho a impressão de que existe um fosso entre os valores com os quais me identifico e os da maioria dos brasileiros." Os valores e a cultura mudam com o tempo e talvez um dia o Brasil seja diferente. Não hoje, infelizmente.
5 Comentarios:
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Meu sentimento é de total impotência. Quando finalmente temos a chance de mudar algo, preferimos nos convencer de que não vale a pena mudar, porque "esse algo" por si só não seria suficiente para mudar o resto. Impera a cultura do medo. Parece que a Regina Duarte "venceu" finalmente. Salve a democracia (ou seria a ditadura da maioria?)!
Ok...eles venceram...mas vamos nos preparar para os próximos, pois agora, esta mesma turma que saiu fortalecida vai fazer questão de que venham mais referendos, então é melhor irmos nos preparando com informações fidedignas e sábias sobre: aborto, pena de morte, casamento entre homossexuais, alteração da menoridade penal, etc.
Também estou com esta sensação de ET por ver que meus valores e princípios serem tão diferentes da maioria.
Um abraço e...MUITA PAZ...ao menos a Paz de consciência nós temos hoje.
Fico triste também, ainda mais porque, por estar longe, tenho aquele ponto de vista sociológico do observador externo. Aliás, o resultado do referendo foi notícia dos principais telejornais da Inglaterra e da Alemanha (que assisti por causa do meu curso, hehe).
Car@s,
acho que a vitória do não foi um pouco pior do que a simples manutenção do status quo. Na linha do que a Regina apontou, acredito que o gênio saiu da garrafa e que a direita mais tacanha (Bolsonaro, Fleury etc) aprendeu que pode ganhar referendos e plebiscitos sobre temas controversos. Acho que teremos mais deles pela frente. Escreverei sobre o tema.
Abraços
Postar um comentário
<< Home