domingo, fevereiro 20, 2005

A Vocação de Todos

"O funcionalismo é a profissão nobre e a vocação de todos. Tomem-se, ao acaso, 20 ou 30 brasileiros em qualquer lugar onde se reúna a nossa sociedade mais culta, todos eles ou foram, ou são, ou hão de ser, empregados públicos, se não eles, seus filhos."

Joaquim Nabuco, político, diplomata e pioneiro das ciências sociais brasileiras, escreveu essas palavras em O Abolicionismo, há uns 120 anos. Me surpreendo em constatar o quanto elas permanecem verdadeiras. Ultimamente, não consigo ir a uma festa, ou passar por uma roda de conversa com mais de quatro pessoas em que não se discuta a oportunidade de um concurso público.

Como leciono num preparatório para o Itamaraty, sempre me perguntam sobre a prova e a carreira diplomática - o chanceler deveria me pagar um pro labore pela quantidade de dúvidas que tiro. É impressionante o quanto meus colegas de pós-graduação estão interessados na possibilidade de ingressar no Ministério das Relações Exteriores, que paga melhor do que as sucateadas universidades públicas, que além disso realizam poucos concursos.

O entusiasmo com o funcionalismo vem, claro, dos problemas econômicos do país e de uma certa saturação no mercado de trabalho de várias profissões. O lado bom dessa situação é que o serviço público está atraindo uma juventude com alta escolarização, recrutada por mérito. No futuro, quando essa geração chegar a cargos de chefia, o impacto sobre a eficiência do Estado será grande. Meu irmão fala com admiração dos jovens juízes, preocupados com temas sociais e outro dia conheci uma moça muito simpática e inteligente numa festa, que lá pelas tantas me contou que é agente especial da Polícia Federal, encarregada da segurança do embaixador dos EUA em Brasília!

Com boas oportunidades de treinamento e formação, o funcionalismo continua a desempenhar o papel identificado por Nabuco: "abriga todos os pobres inteligentes, todos os que têm ambição e capacidade, mas não têm meios, e que são a grande maioria dos nossos homens de merecimento." Troquemos "pobres" por "pessoas da classe média" e creio que teremos um retrato razoavelmente preciso.

1 Comentarios:

Blogger Maurício Santoro said... Weblog Commenting and Trackback by HaloScan.com

Dom Pupo,

acho que existe esse lado ruim que você mencionou, com certeza. Vejo isso em minha própria família com bastante força.

Mas o outro lado da moeda é ter pessoas competentes a serviço do Estado. A mentalidade de alguém contratado por concurso (meu irmão) é bem diferente de quem entrou por clientelismo (meu pai).

fevereiro 21, 2005 10:34 AM  

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