O Império Derrotado
Grande livro na praça: “O Império Derrotado: Revolução e Democracia em Portugal”, do historiador britânico Kenneth Maxwell, autor de excelentes estudos sobre a Inconfidência Mineira, o marquês de Pombal e outros temas da história luso-brasileira. A nova obra narra o declínio do regime autoritário em Portugal, a Revolução dos Cravos e o desmantelamento do império colonial na África.
Este último ponto foi o que me atraiu para o livro. Por conta do meu trabalho de cooperação com os movimentos sociais da África Austral conheci pessoas que se envolveram nas lutas de libertação colonial e sabia o quanto a independência de Angola e Moçambique fora importante para a queda do apartheid na África do Sul e para o fim do regime branco na Rodésia, atual Zimbabwe.
Maxwell analisa com maestria os interesses econômicos envolvidos na região – Portugal com freqüência serviu de testa-de-ferro para companhias de outros países europeus – e de como os jovens oficiais que serviram nas guerras africanas acabaram adotando métodos e ideologias dos grupos rebeldes que foram combater, formando o Movimento das Forças Armadas (MFA) que foi essencial para a derrubada da ditadura portuguesa.
A maior parte dos capítulos do livro trata das disputas de 1974-1976 entre o MFA, comunistas e socialistas pelo controle político de Portugal e pelos rumos da Revolução dos Cravos. Após um período inicial de radicalização, com ocupação de fábricas e de terras e nacionalização de bancos, o país se divide entre um norte conservador e um sul rebelde, chegando próximo à guerra civil.
Meu interesse pelo período veio sobretudo das aulas que tive no mestrado com o sociólogo português Manuel Villaverde Cabral, mestre que alia erudição, simpatia e bom humor e brindou seus alunos com saborosas narrativas e análises do salazarismo, da Revolução e da construção da democracia. Pensei muito nele ao ler este livro.
Como bom historiador político, Maxwell está sempre atento aos líderes políticos, cujo comportamento é fundamental em momentos de crise e num país de instituições democráticas fragilíssimas, como era Portugal na época. Assim, temos ótimos perfis dos militares do MFA, do líder comunista Álvaro Cunhal e sobretudo do socialista Mário Soares, que no retrato do autor foi o herói do processo, dando à transição portuguesa um caráter moderado, sintonizado com o resto da esquerda da Europa Ocidental.
Outra característica marcante dos livros de Maxwell é a habilidade com que examina os vínculos entre política doméstica e o contexto internacional. Vemos como Portugal se situava nas relações com os EUA e sua participação na OTAN, a transformação da África Austral num campo de batalha da Guerra Fria, com envolvimento dos Estados Unidos, URSS, Cuba e China e a importância da Comunidade Européia para a consolidação democrática portuguesa, com os conflitos entre os comunistas locais e seus parceiros na Itália e França (que se assustaram com o radicalismo luso) e o apoio decisivo –inclusive financeiro - dos socialistas franceses e alemães a Mário Soares.
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