domingo, dezembro 18, 2005

Todos os Fogos o Fogo


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“Não sei sobre o que é o livro, mas desde que li o título fiquei com vontade de comprá-lo”, me disse uma amiga. Ainda não lhe contei que a expressão significa algo como a “paixão é uma só e tem sempre efeitos devastadores, não importa a época”. Numa descrição mais cotidiana, é como se chama uma pequena coletânea de oito contos do escritor argentino Julio Cortázar, mestre maior das letras latino-americanas.

Instrução aos navegantes: Cortázar não é para todos os gostos. Numa leitura apressada, seus contos podem parecer confusos, ou darem a sensação de que ainda não estão prontos. Por exemplo, “A Auto-Estrada do Sul” soa à primeira vista uma história de realismo fantástico sobre um engarrafamento quase sem fim na rodovia que vai a Paris. Degustando-a com calma, percebe-se que é um canto sobre a fragilidade das relações humanas e como mesmo os sentimentos mais profundos são efêmeros. Espécie de “Sinal Fechado” em prosa.

Em “Senhorita Cora”, talvez o melhor conto do livro, o leitor precisa ficar atento para acompanhar a voz dos múltiplos narradores, que se revezam nos mesmos parágrafos para narrar o jogo de sedução e repulsão entre um adolescente internado num hospital e sua enfermeira, poucos anos mais velha. Tudo com tanta sensibilidade e delicadeza que é impossível não se emocionar e sentir empatia pelos protagonistas.

Em “Reunião”, Cortázar adota a voz narrativa de ninguém menos do que Che Guevara, para celebrar os primeiros dias da guerrilha da Revolução Cubana, quando todos eram jovens, idealistas e os sonhos não pesavam mais do que um fuzil. Mas preferi “O Outro Céu”, no qual um homem preso a um cotidiano de tédio inventa um mundo alternativo feito de cortesãs, assassinatos misteriosos e galerias sombrias.

“A Ilha do Meio-Dia” e o conto que batiza o livro são histórias sobre obssessões. De um comissário de bordo por uma ilhota grega que avista três vezes por semana, da janela do avião, e de dois casos de amor trágicos que refletem o poder destruidor da paixão.

Os contos restantes, “A Saúde dos Doentes” e “Instruções a John Howell” falam sobre a tênue fronteira enfre ficção e realidade. De uma família cujas mentiras a uma mãe enferma acabam por enredar a todos numa trama de silêncios e de um homem preso num estranho jogo em uma peça teatral.

A quem se interessar por Cortázar, recomendo começar pelo livro “As Armas Secretas”, em especial o conto “O Perseguidor” - obra-prima absoluta sobre a queda de um músico de jazz, inspirado em Charlie Parker. Claro, o texto mais famoso de Cortázar é o romance “O Jogo da Amarelinha”, que espero ler no próximo ano, quem sabe em algum café de Buenos Aires.

3 Comentarios:

Blogger Vitor Dornelles said... Weblog Commenting and Trackback by HaloScan.com

O "Histórias de Cronópios e de Famas" também é muito bom. Valeu pelas dicas.

dezembro 19, 2005 8:48 PM  
Blogger Glauco Paiva said... Weblog Commenting and Trackback by HaloScan.com

Meu véio, eu já não leio mais sobre livros. Porque cheguei à conclusão que já li tanto sobre o assunto que montei na cabeça uma biblioteca de títulos da qual, estou certo, não vou dar conta antes de morrer, mesmo que eu viva 100 anos. Então, fica só o meu Feliz Natal para o querido amigo.

dezembro 19, 2005 9:06 PM  
Blogger Maurício Santoro said... Weblog Commenting and Trackback by HaloScan.com

Salve, Vitor.

Entrei numa comunidade do Orkut sobre literatura hispanoamericana e um dos tópicos é "Amo Cortázar". O pessoal tem elogiado vários dos livros dele.

Grande Glauco,

feliz Natal para você também, meu caro. E se resolver abrir exceções na biblioteca, recomendo Cortázar.

Abraços

dezembro 21, 2005 9:40 AM  

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