Breve Romance de Sonho
A feira do livro está no Largo da Carioca, há alguns passos de onde trabalho, de modo que com freqüência passeio por lá e cisco por entre as barracas. Encontrei ótimas ofertas e comprei muitos livros interessantes, principalmente de ficção, como "O Lobo da Estepe" e "Nosso Homem em Havana". Escolhi comentar "Breve Romance de Sonho", do escritor austríaco Arthur Schnitzler, por ser o menos conhecido deles, e por ter sido uma obra que me impressionou bastante.
Nunca tinha lido Schnitzler, mas sabia que ele havia sido um artista brilhante e um dos mais importantes representantes da vida cultural da Viena do início do século XX, com relações estreitas com a psicanálise - reza a lenda que Freud relutou em ser apresentado a ele, de tão parecidas que eram suas idéias. De fato, "Breve Romance de Sonho" é uma jornada fascinante pelo que um pitoresco político brasileiro chamaria de "instintos primitivos", e que o dr. Freud preferiu batizar de "pulsões".
Se você viu o filme "De Olhos Bem Fechados", de Stanley Kubrick, já conhece a trama básica de "Breve Romance de Sonho". Um jovem casal de classe média vai a um bale de máscara e se excita com as fantasias. De volta à casa, mais animados do que de costume, acabam fazendo confidências e a mulher confessa que pensou em trair o marido com um rapaz que conheceram nas férias de verão.
A revelação deixa o homem perturbado. Ele inicia então um passeio pela Viena noturna, onde por baixo da respeitabilidade do cotidiano se esconde um mundo de prostituição, orgias e desejos reprimidos. Após essa jornada, retorna para sua mulher e ambos resolvem tentar esquecer os estranhos acontecimentos pelos quais passaram, mantendo a fachada de um "casamento normal".
O ponto para Schnitzler é que a "normalidade" só existe como uma espécie de máscara, porque as pessoas são cheias de sentimentos e paixões não muito compatíveis com o decoro público. O filme de Kubrick é uma boa adaptação, mas fica tudo muito glamouroso, a começar pelo elenco estelar (Tom Cruise e Nicole Kidman). O melhor de "Breve Romance de Sonho" é justamente a transição quase imperceptível entre o mundo cotidiano da classe média vienense, onde tudo é aparentemente limpo, claro e bem organizado, e as zonas sombrias dos desejos ocultos. Alguns dos personagens parecem saídos dos casos do dr. Freud. Em suma, grande livro. Vou procurar mais obras do mesmo autor.
4 Comentarios:
Fala Mauricio,
Acho esse livro demais mesmo. Achei interressante a forma como ele passava de realidade ao sonho de uma forma crescente, do meio pro final parece até que não tinha lá muita difença, o ambiente parecia o mesmo.
Grande André,
é verdade. O sonho que a mulher conta ao marido parece mais real do que a noite de delírios dele. E ela diz uma frase crucial: "Um sonho nunca é apenas um sonho". O Dr. Freud deve ter ficado arrepiado.
Abraços
Oi, Maurício Santoro (parente do Rodrigo Santoro?? *risos* que bobeira a minha!)!!
Estava pesquisando um pouco sobre Arthur Schnitzler e vim parar aqui no seu blog.
Acabei de ler "Senhorita Else" e gostei muito. Vou começar a ler "Contos de Amor e Morte" e depois "Senhora Beate e seu filho"... eu quer ler tudo que for possível do autor! :)
Tem um pouco a ver, mas não muito: você já viu "Jornada da Alma"? O filme fala um pouco sobre o início da psicanálise e sobre um caso que Jung teve com uma paciente mais ou menos no início da carreira (foi a primeira paciente a ser psicanalisada por ele). Achei interessante (talvez o filme pudesse ser bem melhor, mas mesmo assim é interessante!!).
Bom, é isso!!
Abraços!
caro Maurício, "breve romance de sonho" é mesmo um livro arrepiante. há um comentário sobre ele na revista Pensamento. uma parte está disponível no blog www.pensas.blogspot.com.
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