Um Debate Sobre Ajuda à África
O economista queniano James Shikwati é um dos principais defensores do fim da ajuda oficial ao desenvolvimento (AOD) à África, sob a justificativa de que ela só reforça a dependência e é desviada por elites corruptas. Uma aluna me perguntou o que eu achava da opinião e respondi que ela tinha muito de verdadeira, com a ressalva de que o mais importante é a mudança nas regras do comércio internacional. Se os países ricos abrissem seus mercados aos produtos agrícolas africanos, o impacto seria muito mais benéfico do que o aumento da AOD.
Apesar disso, existem várias razões pelas quais a AOD é necessária para África, principalmente para combater a disseminação de doenças (AIDS, malária, tuberculose) e melhorar a infra-estrutura de energia e transporte. Os países africanos não têm recursos para lidar com esses problemas e resolvê-los é vital para aumentar a produtividade agrícola e salvar vidas.
O economista Jeffrey Sachs (foto) foi nomeado recentemente para coordenar o projeto das Metas do Milênio da ONU. Suas discussões estão no centro da cúpula que começou nesta quarta e Sachs deu uma ótima palestra no Conselho das Relações Exteriores dos EUA discutindo como diminuir a pobreza global.
Ele defende a AOD e não toca no tema do comércio, embora trate da necessidade de quebra de patentes em remédios e insumos agrícolas. O que achei mais curioso foi o ódio – não há outro termo para descrever – que muitos americanos têm à ajuda humanitária. Sachs comentou que recebe muitos e-mails com ofensas e agressões e até alguns dos participantes do debate o atacam de maneira um tanto virulenta.
Há diversos acordos na ONU que estabelecem que os países ricos alocarão 0,7% do PIB para AOD, mas só os nórdicos e a Holanda cumprem essa meta. Os EUA se limitam a 0,16% e ainda impõem condições que são fruto das pressões da direita religiosa, como enviar recursos apenas para programas anti-AIDS que promovam a abstinência sexual.
7 Comentarios:
Primeiro ponto: sobre os EUA, há uma velha piada que diz que os americanos gostariam de ver a ajuda externa "cortada" para 10% do PIB ou do orçamento, quando na verdade ela é apenas 0,16% do orçamento.
Não sei o quanto essa piada tem de verdade sobre o "povo americano" como um todo - se é que é possível generalizar assim um país tão polarizado. Mas o ódio da direita ultra-liberal lá da terra do Bush a qualquer tipo de ajuda externa chega a níveis surreais. Teve gente que chegou a sugerir, por exemplo, que o governo americano não deveria ter sequer ajudado as vítimas do tsunami na Ásia(!!!), já que "toda e qualquer ajuda desse tipo deveria ser feita apenas através de doações particulares, e não do governo", como você pode ler aqui:http://www.aynrand.org/site/News2?page=NewsArticle&id=10688&news_iv_ctrl=1021
Poucas coisas no mundo são mais bizarras que a direita americana, Maurício, vai por mim.
Segundo ponto: mesmo a mudança de regras no comércio internacional não é tão "salvação da lavoura" da África quanto se propõe por aí. Afinal, é preciso lembrar que muitos países pobres não são agroexportadores. Dá uma olhada nesse post: http://sambadoaviao.blogspot.com/2005/03/o-pobre-o-rico-e-o-miservel.html.
Aliás, recomendo bastante esse blog, o Samba do Avião, que eu descobri via Smart Shade of Blue. No post de 06/09 tem uma análise muito boa sobre as responsabilidades e portunidades brasileiras no aquecimento global. E outro monte de coisas interessantes nos arquivos.
[]s,
Opa, o link que eu dei do Ayn Rand Intitute leva para outro artigo, sobre o mundo islâmico - que por sinal, também é uma pérola de "sensibilidade diplomática".
Aqui sim, o link para o artigo original: http://www.capmag.com/article.asp?ID=4072 . Há um update que eu não tinha lido à época, e que é, digamos, "contemporizador". O update diz que a ajuda governamental não é "tão ruim assim, dá pra aguentar", mas que o dinheiro seria melhor empregado "para ajudar os combatentes que lutam pela nossa liberdade no Iraque". Sem comentários.
Salve, Edson.
Não é piada, as pesquisas de opinião mostram que os americanos de fato acreditam que são o país que mais contribui com AOD no mundo. E de fato existe uma corrente muito forte que prega a privatização da ajuda, em geral por organizações religiosas.
Obrigado pelo link para o Samba do Avião, a discussão que ele puxa é muito interessante. A questão é pesar os lucros dos países pobres agroexportadores com os prejuízos dos menos desenvolvidos.
Você tem acompanhado a polêmica dos conservadores dos EUA em torno do filme sobre os pinguins? O Smart tratou disso e quando vir o filme pretendo falar do assunto também.
Abraços
Cabe questionar se o problema dos países pobres, Brasil entre eles, é somente econômico ou basicamente social, como disse Celso Furtado. Qual a saída para esses países? Crescimento econômico? Crescer concentrando renda pode não ser lá grande coisa. Os brasileiros que o digam.
Eu gostaria de poder ajudar na discussão, mas creio que sou inculto o suficiente, porém sensível para saber quando me abster de um comentário opinativo e apenas deixar um "estive aqui".
Menjol,
sem dúvida, crescer não é suficiente, como nos ensinaram mestres como Celso Furtado, Amarthya Sen e Joseph Stiglitz. Creio ser uma "condição necessária, mas não suficiente" do desenvolvimento, em especial em países muito pobres, como os da África.
Rod,
"Se todos recebêssemos o que merecemos, quem escaparia do chicote?" (Shakespeare, Hamlet). Opine à vontade, o blog está aqui para isso.
Abraços
...please where can I buy a unicorn?
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