Mulheres de Atenas
Diane Kruger como Helena de Troia
O caderno Mais! da Folha de S. Paulo teve como matéria principal no domingo uma análise sobre Helena de Tróia, trazendo diversas interpretações para o mito, tal como ele é narrado por Homero, pelo sofista Górgias e por pensadores contemporâneos, como Jacques Lacan (não dá para linkar, porque os arquivos só estão disponíveis aos assinantes do jornal ou do UOL). O ponto central era se Helena era culpada ou inocente, uma espécie de Capitu da Grécia Antiga.
Achei surpreendente que o caderno tenha dado tão pouca atenção à Helena de Tróia que aparece no "Fausto" de Goethe, porque é uma das representações mais fortes do que o poeta alemão chamou de o Eterno Feminino - embora a minha favorita continue sendo a Beatriz da "Divina Comédia" de Dante. Mas de modo geral chama a atenção o machismo das análises. A mulher nos mitos gregos é na melhor das hipóteses uma dor de cabeça para o herói, quando não a fonte de todos os males, como Pandora abrindo sua célebre caixa. Mesmo as interpretações mais favoráveis ainda as vêem como ambíguas e um tanto traiçoeiras.
Os mitos precisam se modernizar para acompanhar os novos tempos e os papéis cada vez mais destacados que as mulheres assumiram na sociedade. A versão mais recente do filme "Tróia", falha nessa funçao. Apesar da beleza da atriz Diane Kruger, que ilustra o post, sua Helena é pouco mais do que uma Patricinha mimada, nada tem da manha política com que Homero a retratou.
Por coincidência, ontem à noite a Bandeirantes exibiu o segundo programa de um documentário dedicado a Chico Buarque. O episódio, "Á Flor da Pele" foi justamente sobre a mulher na obra do compositor e ele ressaltou que adora escrever e cantar sob o ponto de vista feminino, como se fosse outra pessoa. Destacou também o quanto as mulheres independentes e rebeldes de suas canções são um contraste com as Amélias conformistas dos compositores dos anos 40/50. Resignação que tão bem ironizou em "Mulheres de Atenas":
Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Vivem pros seus maridos, orgulho e raça de Atenas
Quando amadas, se perfumam
Se banham com leite, se arrumam
Suas melenas
Quando fustigadas não choram
Se ajoelham, pedem, imploram
Mais duras penas
Cadenas
Mirem-se no exemplo daquelas mulheres de Atenas
Despem-se pros maridos, bravos guerreiros de Atenas
Quando eles se entopem de vinho
Costumam buscar o carinho
De outras falenas
Mas no fim da noite, aos pedaços
Quase sempre voltam pros braços
De suas pequenas
Helenas
Meu amigo Guilherme compôs uma paródia hilária dedicada aos homens italianos que adoram cozinhar ("Mirem-se no exemplo, do Giorgio, de Alba") que cantávamos às gargalhadas pelos restaurantes do Piemonte, quando estudamos na Itália. Rindo, castigam-se os costumes. Mas que personagens/mitos/símbolas minhas leitoras vêem como representando as mulheres contemporâneas? O glamour em busca de amor das protagonistas de Sex and the City? A serenidade majestosa de Fernanda Montenegro? Cartas à redação, comentários ao blog.
5 Comentarios:
Caro,
Antigona é uma exceção nos mitos clássicos. Uma mulher que desafia a ordem, o estado em nome da justiça, da família....
Abraço,
Fala Maurício,
Eu acho que o homem sempre teve medo do poder feminino. Aquele papo de Lilith que queria ser igual ao homem é um caso clássico, rapidinho apareceu uma Eva na história e a Lilith virou um demonio...
Nós homens nos esforçamos pra deixar a mulher de lado e elas só conseguem espaço na marra e muitas vezes admiramos a mulher que tenha atributos masculinos.
Eu gosto de Anita Garibaldi.
Sex and the City nem pensar. No último episódio todas elas casam, felizes com suas vidinhas finalmente "resolvidas". Decepção total! Nada contra o casamento. Muito pelo contrário! Mas esperava uma conclusão menos conclusão, se é que vc me entende...
O meu troféu Mulher de Atenas vai para quem conseguir misturar Heloísa Helena (ou Alice Amsden) com Viviane Senna. Será que é muito difícil? Endurecer sem perder a ternura é ainda mais difícil para as mulheres, Maurício. Acredite em mim!
Beijão, amigo!
Car@s,
Vamos pela ordem.
JD, Antígona é uma heroína para mim por sua defesa de valores éticos que estão acima de qualquer Estado.
Mas ela era bem vista pelos gregos? Porque no fim da peça, acaba provocando a ruína da cidade, embora eu concorde que a culpa foi do rei e de suas leis inflexíveis.
Outra heroína assim, no teatro contemporâneo, é a Nora de "Casa de Bonecas", que abandona marido e filhos em busca de sua liberdade e felicidade. Mas heroína para quem? Do ponto de vista da família, não.
André,
Sem dúvida! Além de Anita, talvez a Olga Benario também seja uma heroína com essas características.
Ju,
Bem sei, bem sei... Também não é fácil para os homens.
Abraços
PQ O CHICO BUARTE CHAMA AS MULHERES DE ATENAS DE HELENAS??
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