Matriarca
Minha tia-avó Carmela era uma candidata improvável à matriarca dos Santoro. Durante muito tempo ela estava em segundo plano, ofuscada pela personalidade forte da minha avó. Mas com o passar dos anos e a morte dos outros irmãos, ela sobreviveu para ser o único elo da família com os "velhos tempos".
Não tenho certeza, mas acho que tia Carmela foi a primeira Santoro a nascer no Brasil, o que por si só a torna um símbolo para todos nós. Além disso, gerou uma vasta prole - quatro filhos e um número de netos e bisnetos. Quando nos reunimos para as festas, vê-los todos juntos dá uma sensação forte de estabilidade e continuidade (quatro gerações!), muito embora um lado de mim saiba que a atitude correta seria chamar a polícia e prender metade daqueles cretinos.
A tia destoa do resto da família pela aparência. Ao invés dos traços escuros do Mezzogiorno italiano, ela e os seus têm feições claras, com cabelos louros e olhos azuis ou verdes, característicos do norte do país. Coisa curiosa, pois mesmo o seu irmão gêmeo era bem moreno. Talvez seja um gene recessivo ou então minha bisavó andou de simpatias por algum compatriota setentrional. O fato é que formou o ramo mais bonito dos Santoro, duas de suas netas inclusive se tornaram modelos profissionais.
Como era tradicional nas mulheres de sua geração, tia Carmela teve pouca instrução formal e viveu para a casa e os filhos. Acrescente-se ao pacote um marido mulherengo e trapaceiro que aprontou tramas inacreditáveis, parte do folclore da família - como inventar uma concessão de petróleo na Bahia e perder alguns (plural) apartamentos para amantes. Mas a tia sobreviveu a tudo isso com um estilo e uma serenidade que são verdadeiramente fenomenais. O tal gene recessivo devia ser de um conde normando.
Dificilmente ela terá uma sucessora. Minha mãe é rígida demais para o cargo, minha tia está no extremo oposto. Minhas primas não têm estabilidade emocional nem para brincar de casinha, quanto mais para reger uma família tão complicada. Eu estou ocupado bancando o acadêmico arrogante, papel que me cai bem e que exerço com a dedicação de um assassino de romance policial inglês. Creio que sobrará para meu irmão. Já é o consultor jurídico dos nossos e tem tudo para ser o futuro Dom Santoro, instaurando um patriarcado.
Mas hoje celebraremos o aniversário de 80 e muitos anos da nossa matriarca. O futuro fica para depois.
Não tenho certeza, mas acho que tia Carmela foi a primeira Santoro a nascer no Brasil, o que por si só a torna um símbolo para todos nós. Além disso, gerou uma vasta prole - quatro filhos e um número de netos e bisnetos. Quando nos reunimos para as festas, vê-los todos juntos dá uma sensação forte de estabilidade e continuidade (quatro gerações!), muito embora um lado de mim saiba que a atitude correta seria chamar a polícia e prender metade daqueles cretinos.
A tia destoa do resto da família pela aparência. Ao invés dos traços escuros do Mezzogiorno italiano, ela e os seus têm feições claras, com cabelos louros e olhos azuis ou verdes, característicos do norte do país. Coisa curiosa, pois mesmo o seu irmão gêmeo era bem moreno. Talvez seja um gene recessivo ou então minha bisavó andou de simpatias por algum compatriota setentrional. O fato é que formou o ramo mais bonito dos Santoro, duas de suas netas inclusive se tornaram modelos profissionais.
Como era tradicional nas mulheres de sua geração, tia Carmela teve pouca instrução formal e viveu para a casa e os filhos. Acrescente-se ao pacote um marido mulherengo e trapaceiro que aprontou tramas inacreditáveis, parte do folclore da família - como inventar uma concessão de petróleo na Bahia e perder alguns (plural) apartamentos para amantes. Mas a tia sobreviveu a tudo isso com um estilo e uma serenidade que são verdadeiramente fenomenais. O tal gene recessivo devia ser de um conde normando.
Dificilmente ela terá uma sucessora. Minha mãe é rígida demais para o cargo, minha tia está no extremo oposto. Minhas primas não têm estabilidade emocional nem para brincar de casinha, quanto mais para reger uma família tão complicada. Eu estou ocupado bancando o acadêmico arrogante, papel que me cai bem e que exerço com a dedicação de um assassino de romance policial inglês. Creio que sobrará para meu irmão. Já é o consultor jurídico dos nossos e tem tudo para ser o futuro Dom Santoro, instaurando um patriarcado.
Mas hoje celebraremos o aniversário de 80 e muitos anos da nossa matriarca. O futuro fica para depois.
4 Comentarios:
Meu amigo,
Tai uma coisa que nunca imaginei. Seu irmão como o Don Santoro. Sempre o vi como aquele mais afastado da família, que seguia carreiras sem muita ligação com os Santoros.
Mas talvez seja algo como Michael Corleone.
Dom Leandro,
a comparação do Márcio com Michael é ótima. Até na Máfia de vez em quando se precisa de um rosto novo para assumir os negócios.
Mas meu fratello já lidera a Ala Moça da Família, em que todo mundo estuda Direito.
Nesta produção, ficarei com o papel de Tom Hagen - um consigliere, dando um toque aqui e ali.
Olha, não é nada pessoal com relação ao seu irmão, mas sou contra instaurar um patriarcado na família. Sua tia daria uma matriarca do tipo "rainha de copas"!
bjs, Leticia
Letícia,
Minha tia anda muito ocupada para reger a Família. O hobby dela agora é comprar DVDs piratas, que em geral não funcionam, daí ela pede ajuda ao meu irmão. Se ela virar rainha de Copas, corro atrás do primeiro coelho maluco que aparecer e atravesso o espelho em busca de um pouco de paz.
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