A Lição do Mestre
O destaque do segundo dia da conferência foi a palestra sobre África do embaixador Alberto da Costa e Silva. João Daniel diz que é o intelectual mais completo do Brasil e concordo com ele: quantos pensadores são capazes de dissertar com igual brilho e elegância sobre o processo de formação dos Estados africanos, os impactos do tráfico negreiro nas Américas, as métricas dos poetas românticos e a gênese do frevo e do jogo do bicho? Além disso, o embaixador morou em Portugal, Brasil e Nigéria – as três matrizes que formaram nossa cultura e povo. E é um apaixonado por nosso país, coisa não tão comum no que diz respeito à elite pátria.
Em sua palestra, Costa e Silva falou dos problemas de instabilidade política enfrentados pela África, destacando como o “continente da esperança e da utopia” de seus tempos de jovem diplomata nos anos 50 transformou-se numa terra de desalento. Mas afirmou otimismo diante do extraordinário espírito inventivo dos africanos, ressaltando que as dificuldades pelas quais passam também foram obstáculo para muitos outros países.
O embaixador está aposentado e criticou as posições oficiais do Brasil com relação à África, dizendo que é preciso abandonar a “mentalidade fenícia” de equiparar diplomacia a saldos no comércio exterior. O continente africano é um interesse estratégico brasileiro, que requer atenção constante e “a política externa é sobretudo política”. Foi ovacionado.
Defendeu em especial a concessão de bolsas de estudos a universitários africanos, para formar uma elite dirigente com laços fortes no que diz respeito ao Brasil.
Os diplomatas da ativa apressaram-se em enumerar as ações brasileiras na África. De fato, não são poucas. O comércio cresce, bem como cooperação nas áreas militar, de saúde, educação e agricultura. A Embrapa acabou de inaugurar uma agência em Gana, para realizar parcerias agrícolas com países da África Ocidental. E o presidente Lula já esteve várias vezes no continente (ainda que cometendo as gafes costumeiras).
Um tema que surgiu no debate com a platéia foi a necessidade de rever certos aspectos da história brasileira, dando crédito às contribuições técnicas e econômicas dos africanos para a economia do país, como no desenvolvimento da mineração, da fundição e da própria maneira de criar o gado, que segue os padrões da África Ocidental e não os de Portugal.
Ir à África para reencontrar e reinterpretar o Brasil. Eis aí um belo programa de pesquisa para os acadêmicos brasileiros.
1 Comentarios:
Meu caro,
há uma enorme distância entre a história que me ensinaram no segundo grau, ou mesmo na universidade e a pesquisa que vem sendo feita por uma talentosa geração de novos historiadores brasileiros.
Oxalá essa lacuna diminua pelos próximos anos...
Abraços
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