Lá vem o Chávez
Tal como seu homônimo mexicano, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, vive num barril - só que de petróleo. Como o preço do ouro negro quintuplicou na última década, o Estado venezuelano foi salvo da bancarrota fiscal. Essa é a base econômica da chamada "Revolução Bolivariana" que tornou Chávez a principal estrela do Fórum Social Mundial.
Lula tem uma relação ambígua com o Fórum. Sua agenda política é a da estabilidade e ele se esforça para se afastar das correntes mais radicais em Porto Alegre (e elas são muitas) e para estabelecer pontes com o mundo de Davos - o projeto de uma campanha global contra a fome e a pobreza é o melhor exemplo disso. Os ministros presentes no FSM foram recebidos de maneira diversa, com aplausos entusiasmados (Gilberto Gil), vaias (Luís Dulci) ou uma mistura de ambos (Olívio Dutra e o próprio Lula). De modo geral, falar bem do governo não fazia ninguém popular em Porto Alegre.
Chávez se aproveitou desse vácuo político para lançar a cartada de se posicionar como o presidente que mais apóia o FSM e mais se identifica com suas idéias. Fez um intenso trabalho de lobby junto aos organizadores do Fórum para que realizem uma edição do evento na Venezuela. Com uma retórica radical, que parece ter saído dos anos 60, Chávez conquistou a simpatia dos participantes do FSM. Sua palestra no ginásio do Gigantinho, no último dia do fórum, foi anunciada em cartazes pela cidade como um show de rock e reuniu mais de 20 mil pessoas, incluindo este que vos escreve.
Cheguei com uma amiga do IBASE uma hora antes do discurso e já não havia lugares no estádio. Nos sentamos no estacionamento, onde uma multidão esperava junto a um telão. Acabou sendo uma ótima opção: conhecemos um grupo de americanas simpaticíssimas e conversamos sobre EUA e América Latina. Elas ficaram espantadas em saber que temos acesso aos canais de TV dos EUA, mas que recebemos pouquíssimas informações dos nossos vizinhos de continente, pois os jornais brasileiros só têm correspondentes em Buenos Aires. Claro que contei sobre meus planos na Argentina e elas rolaram de rir com as objeções da CAPES.
O discurso de Chávez seguiu o padrão Fidel Castro - longo (duas horas), sem estrutura rígida ou texto pré-preparado, se assemelhando mais a um bate papo com a platéia. Assim como o cubano, Chávez é um comunicador carismático. Poucas vezes vi um orador com tanto domínio das habilidades retóricas. Imaginava algo próximo ao estilo de Lula, com piadas sobre futebol e evocações sentimentais. Isso aconteceu em alguns momentos - o presidente venezuelano citou Cristo como uma de suas principais fontes de inspiração e até cantou para a platéia. Mas o que me impressionou no discurso foi a capacidade intelectual de Chávez. Não estou de brincadeira. Ele conhece bem história, política e literatura. Um perfil surpreendente para um coronel páraquedista, certas passagens mostravam uma cultura do tipo que se esperaria de Fernando Henrique ou Ricardo Lagos.
A retórica é radical, mais do que populista. Chávez cita com admiração principalmente revolucionários e comunistas e sequer menciona Vargas, Perón ou Haya de la Tore. Foi inacreditável ouvir isso de um presidente. No Brasil, seria um discurso que não elegeria nem chapa de DCE. O tom era agressivo, de confrontação, com ataques frontais aos EUA e ao capitalismo. Claro que a platéia vibrou, mas fiquei me perguntando o que quer esse sujeito. O programa da "Revolução Bolivariana" é na realidade o de uma ampla reforma social, principalmente na educação (incluindo uma excelente campanha de alfabetização em massa) e na saúde. É um projeto que poderia ser emcampado por vários partidos moderados, mesmo num continente retrógrado como a América Latina.
O mais radical de Chávez é sua política externa. Ele contou sobre várias de suas visitas diplomáticas - Iraque, Irã, Rússia e Líbia. Todos grandes produtores produtores de petróleo. Seu atual ministro das Relações Exteriores foi inclusive presidente da OPEP e a Venezuela usa a força econômica do petróleo para buscar mais autonomia internacional, buscando a liderança regional na América Andina e no Caribe. Tem feito esforços expressivos de se articular com Brasil e Argentina, com propostas como a criação de uma TV pública latino-americana.
Qual o futuro de Chávez? Ele resistiu ao golpe e consolidou-se com o apoio de 60% da população e uma guerra civil na Venezuela não interessa a ninguém, porque interromperia a produção de petróleo num momento de crise no Oriente Médio. Então, acredito que os EUA irão tolerá-lo (ainda que com irritação) contanto que o ouro negro continue a fluir para Washington. Mas o projeto de liderança regional de Chávez e sua retórica radical podem quebrar essa frágil trégua. Estou muito curioso para ver de perto o que ocorre por lá. Se o FSM de fato ocorrer em Caracas, há uma boa possibilidade de que eu dê um pulo no nosso vizinho do norte.
Lula tem uma relação ambígua com o Fórum. Sua agenda política é a da estabilidade e ele se esforça para se afastar das correntes mais radicais em Porto Alegre (e elas são muitas) e para estabelecer pontes com o mundo de Davos - o projeto de uma campanha global contra a fome e a pobreza é o melhor exemplo disso. Os ministros presentes no FSM foram recebidos de maneira diversa, com aplausos entusiasmados (Gilberto Gil), vaias (Luís Dulci) ou uma mistura de ambos (Olívio Dutra e o próprio Lula). De modo geral, falar bem do governo não fazia ninguém popular em Porto Alegre.
Chávez se aproveitou desse vácuo político para lançar a cartada de se posicionar como o presidente que mais apóia o FSM e mais se identifica com suas idéias. Fez um intenso trabalho de lobby junto aos organizadores do Fórum para que realizem uma edição do evento na Venezuela. Com uma retórica radical, que parece ter saído dos anos 60, Chávez conquistou a simpatia dos participantes do FSM. Sua palestra no ginásio do Gigantinho, no último dia do fórum, foi anunciada em cartazes pela cidade como um show de rock e reuniu mais de 20 mil pessoas, incluindo este que vos escreve.
Cheguei com uma amiga do IBASE uma hora antes do discurso e já não havia lugares no estádio. Nos sentamos no estacionamento, onde uma multidão esperava junto a um telão. Acabou sendo uma ótima opção: conhecemos um grupo de americanas simpaticíssimas e conversamos sobre EUA e América Latina. Elas ficaram espantadas em saber que temos acesso aos canais de TV dos EUA, mas que recebemos pouquíssimas informações dos nossos vizinhos de continente, pois os jornais brasileiros só têm correspondentes em Buenos Aires. Claro que contei sobre meus planos na Argentina e elas rolaram de rir com as objeções da CAPES.
O discurso de Chávez seguiu o padrão Fidel Castro - longo (duas horas), sem estrutura rígida ou texto pré-preparado, se assemelhando mais a um bate papo com a platéia. Assim como o cubano, Chávez é um comunicador carismático. Poucas vezes vi um orador com tanto domínio das habilidades retóricas. Imaginava algo próximo ao estilo de Lula, com piadas sobre futebol e evocações sentimentais. Isso aconteceu em alguns momentos - o presidente venezuelano citou Cristo como uma de suas principais fontes de inspiração e até cantou para a platéia. Mas o que me impressionou no discurso foi a capacidade intelectual de Chávez. Não estou de brincadeira. Ele conhece bem história, política e literatura. Um perfil surpreendente para um coronel páraquedista, certas passagens mostravam uma cultura do tipo que se esperaria de Fernando Henrique ou Ricardo Lagos.
A retórica é radical, mais do que populista. Chávez cita com admiração principalmente revolucionários e comunistas e sequer menciona Vargas, Perón ou Haya de la Tore. Foi inacreditável ouvir isso de um presidente. No Brasil, seria um discurso que não elegeria nem chapa de DCE. O tom era agressivo, de confrontação, com ataques frontais aos EUA e ao capitalismo. Claro que a platéia vibrou, mas fiquei me perguntando o que quer esse sujeito. O programa da "Revolução Bolivariana" é na realidade o de uma ampla reforma social, principalmente na educação (incluindo uma excelente campanha de alfabetização em massa) e na saúde. É um projeto que poderia ser emcampado por vários partidos moderados, mesmo num continente retrógrado como a América Latina.
O mais radical de Chávez é sua política externa. Ele contou sobre várias de suas visitas diplomáticas - Iraque, Irã, Rússia e Líbia. Todos grandes produtores produtores de petróleo. Seu atual ministro das Relações Exteriores foi inclusive presidente da OPEP e a Venezuela usa a força econômica do petróleo para buscar mais autonomia internacional, buscando a liderança regional na América Andina e no Caribe. Tem feito esforços expressivos de se articular com Brasil e Argentina, com propostas como a criação de uma TV pública latino-americana.
Qual o futuro de Chávez? Ele resistiu ao golpe e consolidou-se com o apoio de 60% da população e uma guerra civil na Venezuela não interessa a ninguém, porque interromperia a produção de petróleo num momento de crise no Oriente Médio. Então, acredito que os EUA irão tolerá-lo (ainda que com irritação) contanto que o ouro negro continue a fluir para Washington. Mas o projeto de liderança regional de Chávez e sua retórica radical podem quebrar essa frágil trégua. Estou muito curioso para ver de perto o que ocorre por lá. Se o FSM de fato ocorrer em Caracas, há uma boa possibilidade de que eu dê um pulo no nosso vizinho do norte.
1 Comentarios:
É preciso institucionalizar a revolução bolivariana BB?
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