sexta-feira, dezembro 10, 2004

Tia Júlia e o Escrevinhador

Lima, anos 50. Numa sociedade provinciana, o jovem Mario, de 18 anos, sonha ser escritor rabiscando contos frustrados nos moldes dos autores europeus que admira. Enquanto isso ganha uns trocados como jornalista e se arrasta pela faculdade de Direito. Seu pequeno mundo sofre uma reviravolta quando chegam duas pessoas da Bolívia. Júlia, uma balzaquiana recém-divorciada, irmã da mulher de seu tio, e Pedro Camacho, um escritor de novelas que se torna a estrela da rádio onde Mario trabalha. Ao se apaixonar pela primeira e se tornar amigo do segundo, ele aprenderá que a literatura é inseparável da vida.

Mario constata que entre todos os pretensos literatos que conhece o único a realmente viver da literatura é Camacho, que prepara folhetins com tramas rocambolescas envolvendo incestos, obsessões, paixões mirabolantes. Os heróis são sempre "cinqüentões, na flor da idade, com bondade e retidão no espírito", como o próprio Camacho gosta de imaginar a si mesmo. E os vilões são argentinos, com conseqüências engraçadíssimas, de protestos diplomáticos a pancadarias nas ruas (o novelista comenta orgulhoso que no passado chegou a provocar movimentação de tropas nas fronteiras).

Vargas Llosa tece o enredo com muita ironia, intercalando os capítulos de seu romance com tia Júlia com os folhetins de Camacho - como quem pisca o olho para o leitor e diz que literatura é literatura e é bobagem fazer distinções entre gêneros supostamente cultos e nobres e outros popularescos e vulgares. As duas tramas esquentam quando o novelista começa a enlouquecer e misturar os enredos e personagens dos programas que escreve e, ao mesmo tempo, a família de Mario descobre o caso dele com a tia e inicia uma caça aos apaixonados.

Para mim, Vargas Llosa é uma admiração literária tardia. Meu encontro com seus romances excepcionais se deu quase por acaso, quando comecei "Conversa na Catedral" numa longa viagem de ônibus entre Santiago de Compostella e Barcelona. Depois disso, vieram em seqüência "O Paraíso na Outra Esquina", "Pantaléon e as Visitadoras", "Lituma nos Andes" e agora este "Tia Júlia e o Escrevinhador", que foi meu preferido. Não é todo dia que encontro alguém com tias mais excêntricas do que as minhas. A propósito, o romance é autobiográfico. Mario casou com a tia Júlia foi feliz. Não para sempre, mas por 8 anos. Depois casou de novo - com uma prima (é sério!).

2 Comentarios:

Blogger Glauco Paiva said... Weblog Commenting and Trackback by HaloScan.com

Tipo.... Você não está pensando em se casar com uma de suas tias... está?

dezembro 11, 2004 12:37 PM  
Blogger Maurício Santoro said... Weblog Commenting and Trackback by HaloScan.com

Glauco, minha admiração pelo Vargas Llosa não vai tão longe. Mas quem sabe escrever uma radionovela? Com sua assessoria de anos de CBN... Estava pensando numa trama melodramática, que começaria com uma cinqüentona, na flor da idade, bondade e retidão no espírito, conhecendo um sujeito na internet... Bom, deixa para lá. Ficaria surreal demais.

dezembro 11, 2004 4:18 PM  

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